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domingo, 17 de maio de 2020

Zau Évua - Centro de Instruão da Polícia angolana


Zaire: Centro de instrução de Nzau-Evua satisfaz responsável

Mbanza Congo
 - O segundo comandante-geral da polícia nacional, comissário-chefe Paulo Gaspar de Almeida, expressou hoje, sexta-feira, a sua satisfação pelas condições de trabalho no centro de instrução de Nzau-Evua, 64 quilómetros da cidade de Mbanza Congo, província do Zaire.



O oficial da corporação teceu estas considerações quando se dirigia a 615 novos efectivos da polícia nacional em formação no referido centro, no quadro da sua visita de trabalho de 48 horas à província do Zaire.
Segundo o responsável, as condições que o centro apresenta em termos de organização e dimensão das suas instalações proporcionam um ambiente salutar para a instrução e formação de todos quantos queiram incorporar-se na polícia nacional.
“Para já, agradecemos os esforços do governo provincial do Zaire de nos ter cedido essas instalações, que consideramos, de momento, as melhores que a polícia nacional tem a nível do país”, assinalou.
Assegurou que o comando-geral da polícia nacional em colaboração com o governo provincial vai envidar esforços para colmatar algumas dificuldades que o centro atravessa, com maior realce para um posto médico.
O centro de instrução de Nzau-Evua abriu as portas em Maio último e comporta, entre outras áreas, direcção, área pedagógica, de apoio e corpo de instruendos.

sábado, 16 de maio de 2020

Tatuagens na Guerra Colonial

AS TATUAGENS QUE CONTAM A HISTÓRIA DA GUERRA COLONIAL






AS TATUAGENS QUE CONTAM A HISTÓRIA DA GUERRA COLONIAL



No início eram tatuagens. Agora são retratos de tatuagens. No início era a guerra colonial. Agora são as memórias que ficaram. Ficam. Cravadas na pele. No corpo. Na mente. Na alma. Bem fundo. Para sempre. Por causa da Pátria. Pela Pátria.

As imagens, essas, não saem da cabeça, por mais esbatidas que estejam no corpo. Passaram anos. Décadas. Na pele, a maioria apresenta-se descolorida. Quase que desapareceram. Por isso, há quem tenha feito a versão 2.0 do “Amor de Mãe”, a frase icónica de quem foi para África. Porque não querem esquecer. Não podem esquecer por mais que, muitos deles, procurem não falar. Sobre o que foram lá fazer e aquilo que estamparam. Porque recuam ao tempo da guerra. E, se o fizerem, dizem: “Não durmo. Se eu lhe contar, eu já não durmo esta noite...”.


sexta-feira, 15 de maio de 2020

Beber pela bota de lona

Aposta ganha
Na foto com um dos civis assalariados que trabalhavam no aquartelamento e com quem todos nós mantinhamos optimas relações


Não há quem não tenha histórias para contar daqueles tempos em que sendo jovens e estando enclausurados entre o arame farpado, o pó das picadas e as operações no matos, davam para as mais impróprias e por vezes inapropriadas e situações.
Num daqueles dia em que as conversas não mais acabavam e as bebidas já toldavam o bom senso do racional onde a conversa puxa conversa, aconteceu o seguinte -
Eu próprio puxei à baila da conversa uma situação passada  com amigo meu,(já falecido e nem cumpr iu serviço militar) nos tempos em que andavamos de terra em terra nas noites de bailaricos, passou-se e pelo sapato que descalçou, servindo de copo, bebeu uma imperial.
Puxando pelo sucedido e comentado, alguem que já não recordo quiz apostar como eu não seria de tomar igual atitude e tomar bebida pela bota que era de lona, como se sabe.
Colocada em jogo a situação, propus que fosse whisky a bebida - e assim aconteceu.
Não me recordo quem perdeu a aposta, mas sei e recordo bem que bebi e ganhei a aposta.

terça-feira, 12 de maio de 2020

Traumas de guerra perduram na memória e nas famílias dos ex-combatentes

Traumas de guerra perduram na memória e nas famílias dos ex-combatentes


A Guerra do Ultramar ceifou vidas, destruiu famílias, minou casamentos. No 90º aniversário do núcleo de Vila Franca de Xira da Liga dos Combatentes, cinco famílias partilharam com O MIRANTE as feridas invisíveis que o conflito causou.

Ex-combatentes da guerra colonial reencontraram-se no âmbito do 90º aniversário do núcleo de Vila Franca de Xira da Liga dos Combatentes e 4º aniversário do monumento que lhes presta homenagem, naquela cidade. Na cerimónia, realizada a 8 de Setembro, na Fábrica das Palavras, em Vila Franca de Xira, Joaquim Chito Rodrigues, presidente da Liga dos Combatentes, lamentou que o Estado se tenha esquecido dos “homens que ainda hoje sofrem por terem estado na guerra”.

Esquecidos, abandonados, sem apoio nem reconhecimento do Estado. Foram estas as ideias e mensagens que marcaram os discursos do presidente do município, Alberto Mesquita, e do presidente da Junta de Vila Franca de Xira, João Santos. Nos 90 anos do Núcleo, o município quis distinguir o trabalho meritório que esta associação tem desenvolvido, atribuindo-lhe, na pessoa do seu presidente, Armindo Silva, a medalha de honra municipal.

Há vários anos que esta iniciativa se realiza, juntando dezenas de ex-combatentes dos três ramos das Forças Armadas que relembram histórias e ainda choram ao ouvir falar da guerra. Recordam as partidas forçadas. O dia do adeus às namoradas, a quem fizeram juras de amor apressadas. No final da cerimónia, cinco ex-combatentes partilharam com O MIRANTE histórias de guerra, das suas famílias e casamentos marcados pela violência doméstica ou pelo silêncio de quem quer esquecer episódios que a memória não apaga. O stress pós-traumático é ferida que não sara.

Levar a guerra para casa

Miguel Barão, ex-paraquedista, foi um dos que levou a guerra para dentro de casa. A disciplina militar, a autoridade e a violência. O alvo principal passou a ser Maria do Céu Ferreira, com quem casou em 1975. Sentados lado a lado, choram os dois ao recordar. Maria do Céu sofreu anos de violência física e psicológica. Foram várias as vezes que pensou em pôr fim ao casamento e confessa que foi pelos filhos que não o fez. Têm sete filhos, entre os 25 e os 43 anos. “Sempre fui um pai muito autoritário, disciplinador, às vezes abusivamente”, conta Barão, 69 anos. Se era violento? O ex-combatente tira a boina verde da cabeça e responde: “Era mais forte que eu”.

Combater era o seu papel. Era matar ou ser morto. O primeiro homem que viu morrer tinha 20 anos. “Estávamos numa emboscada. Caiu-me nos braços”. Episódios trágicos como esse são parte do stress pós-traumático que carrega. Foi treinado para ter auto-domínio e enfrentar o inimigo sem medo, por isso não gosta de mostrar fragilidades e evita falar do assunto. Chegou a receber acompanhamento psicológico no Hospital Psiquiátrico Júlio de Matos mas abandonou as consultas. Vive em Alhandra e diz ser hoje um homem mais controlado mas ferido por dentro.



Os pesadelos da guerra

Nem todos procuraram ajuda médica e esta também não foi ter com eles. Júlio Vicente regressou da Guiné em 1972 e refugiou-se no silêncio. “Guardo para mim as histórias que ninguém quer contar e ninguém quer ouvir. Custa-me recordar e sei que nunca vou conseguir esquecer”, diz. As lágrimas correm-lhe rosto abaixo.

É nos sonhos que regressa à Guiné. “No dia 1 de Fevereiro de 1971 pensei que ia morrer debaixo de fogo ou da fome”, conta. Na casa, em São João dos Montes (Alhandra), a guerra continua a ser assunto tabu. “Não faço perguntas. Só a neta agora vai fazendo algumas”, diz a esposa, Margarida Vicente, que o acompanha sempre nestes encontros. As cartas e aerogramas que o marido lhe escreveu, queimou-as. “Não queremos voltar a ler o que nos magoa”, afirma.

António Francisco, 80 anos, foi marinheiro e serviu em Angola, entre 1967 e 1974. Estava casado há três anos quando embarcou a primeira vez e deixou Joaquina grávida de oito meses. Ao terceiro dia de combate foi baleado na perna direita. Dormia na embarcação, no leito do rio Zaire, carregada de mortos e de feridos esfomeados e por tratar. O ex-marinheiro nunca foi agressivo com a mulher, a não ser enquanto dormia. “Tinha pesadelos de atirar com ela fora da cama. Pensava que estava a empurrar um camarada num ataque”. Deixa cair a cabeça e chora. “Ainda esta noite sonhei com a guerra”, diz.

Dizem que no amor e na guerra vale tudo. No de António valeu a paciência de Joaquina - já falecida - que apesar do pânico tentava compreender as reacções do marido. “Como na noite em que peguei na espingarda e disparei contra a parede da cozinha para matar uma osga”, na casa onde vive, em Vila Franca de Xira.


Ferido no dia que regressava a Portugal

Maria Teresa Oliveira nunca compreendeu porque é que o marido se atirava para o chão sempre que ouvia um foguete. Só quando Mário Oliveira começou a partilhar episódios que viveu no mato, em Moçambique, é que percebeu que estava a lidar com um homem marcado pela guerra. O ex-combatente refugiou-se no álcool e passava muito tempo fora de casa. Piorou com o passar dos anos.

Mário foi ferido em combate, a 11 de Novembro de 1971, o dia em que ia regressar a Portugal. “Faltavam apenas 22 quilómetros até ao cais, quando o comboio foi atacado”. Lembra os corpos caídos e o dinheiro ensanguentado no bolso do motorista. É esta imagem que lhe invade os sonhos e o faz acordar em pânico. “E a fome que passámos, o que sofremos. Passar 20 dias no mato e ter de comer carne de hipopótamo porque não havia mais nada”, refere. Ainda hoje continua a fazer o percurso do Forte da Casa, onde reside, até ao Hospital Júlio de Matos.


Atira-se ao chão com os foguetes

Adriano Fonseca viu morrer à sua frente um camarada, num ataque ao aquartelamento, protegido apenas por duas fileiras de arame farpado. “Não consigo esquecer, ainda sonho com isso”, diz o ex-soldado da Póvoa de Santa Iria que combateu na Guiné de 1970 a 1972. Foi seguido por vários psicólogos para tentar travar o pânico. “Sempre que rebentava um foguete atirava-me para o chão”. E confessa que já perdeu a conta às vezes que acordou aos gritos e a empurrar a mulher.