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quinta-feira, 14 de julho de 2022

Luanda - BO - Bairro Operário não haverá militar que não se recorde do BO

 Luanda - BO - Bairro Operário

Não havia militar que não o conhecesse


Bairro Operário

Serão poucos os luandenses que nunca tenham ido ao Bê Ó. Mas talvez seja altura de o visitar novamente.
Por Pedro Cardoso

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Luanda - BO

As ruas do bairro eram de terra batida. Os casebres de madeira e telhados de zinco tinham pequenas janelas onde prostitutas brancas chamavam os clientes. Na rua H, um jovem médico, Manguxi, dava aulas a jovens pobres. Num quintal, a dikanza marcava os ritmos de Angola, Ngola Ritmos em resistência. Este é o Bairro Operário.

Um dia no Bairro Operário, o que foi o Bê Ó de verdade, move-se pelas ruas da memória de quem o viveu “nos tempos”. “Sonhar é fácil”, poetiza Jacques dos Santos ao site Rede Angola. “Poderia lembrar-me duma farra no salão da Idalina Costa”, inesquecível animadora de festas de arromba de Luanda, mestre de xinguilamento e figura cimeira dos carnavais da cidade. Ou então, um serão “no pátio do Xodó”, dos Ngola Ritmos. E ainda um “trumunu no Campo do Machado”.

A essência do Bairro Operário em poucas palavras.

Recuemos lá atrás, ainda antes dos “finais dos anos 60”, altura em que Jacques passou “momentos inolvidáveis no Bê Ó”. Tempos em que, nas ruas paralelas e perpendiculares, este senhor grande da cultura angolana “estava em contacto quase diário com a essência da angolanidade, com a nossa forma especial de estar na vida nos mais diversos aspectos”.

Estamos nos anos 30.

A fronteira de asfalto e da terra vermelha dos musseques expande-se na Luanda colonial. Nas barrancas do Miramar, surgem cubatas sobre a areia, construídas pelos que estavam para lá do muro colonial – pretos, indígenas, nativos, ou como se queira chamar aos excluídos de então. Muitos deles eram trabalhadores da estação do Bungo e começaram, pouco a pouco, a criar as bases do que hoje conhecemos como Bairro Operário. Rapidamente a Câmara Municipal de Luanda interveio e começou a pôr ordem a este quadrado desenhado nas bandas do São Paulo. Traçou ruas a régua e esquadro mas não as asfaltou. Nem deu água ou luz aos moradores. Musseque meio urbanizado, meio por urbanizar.
Desde cedo o Bê Ó ganhou alma própria. Tornou-se lugar de boémia, de farras monumentais, de personagens que só os que são dali conheceram. Bairro de senhoras brancas que, em janelinhas, convidavam os militares portugueses a entrar a troco de umas moedas e que bazaram quando bazaram todos. Bê Ó periférico, antigo centro de prazeres e pecados. Mas, principalmente, bairro-mãe de algo muito maior: consciência, identidade e resistência.
Quando a luta pela libertação se tornou inevitável, já há muito que a angolanidade se construía a ritmo frenético no interior destes casebres pobres de madeira. Caminhando pela Rua H, nesta visita imaginária, Jacques dos Santos testemunha-nos: “O Bê Ó encerra em si o princípio da emancipação do nosso povo e do início da luta de libertação nacional, o que determina a sua importância não apenas para os luandenses mas para toda a nação angolana. A sua contribuição está implícita no trabalho desses ilustres angolanos que fizeram sempre questão de enaltecer a rica vivência e todas as experiências forjadas nesse bairro.”

Paramos em frente à casa que pertenceu aos pais de Manguxi. No actual Centro Cultural Agostinho Neto, viveu o primeiro Presidente de Angola. Depois de formar-se em medicina, em Portugal, ali voltou para instruir jovens dos musseques. Perto do Bê Ó, abriu um consultório médico.

Enquanto Agostinho Neto, em segredo, forjava-se como líder político, numa velha casa a umas ruas de distância, também no Bairro Operário, Liceu Vieira Dias criava, com outros músicos, o mítico grupo Ngola Ritmos, marco fundamental da luta anti-colonialista. Aqui nasceram clássicos da música angolana de intervenção como “Monami”. Esta canção, contou Amadeu Amorim, dos Ngola Ritmos, ao Jornal de Angola, alertava os jovens negros para não saírem à noite de casa. Eram tempos difíceis, em que brigadas de portugueses varriam de madrugada os musseques da cidade, entre os quais o Bê Ó, matando jovens negros.

2014.

“Nada foi aproveitado”, suspira ao Rede Angola, Jacques dos Santos, também autor do livro ABC do Bê Ó.

Serão poucos os luandenses que nunca tenham ido ao Bê Ó. Mas talvez seja altura de o visitar novamente. O lodo suja e as águas negras correm a céu aberto, é certo. Mas muitas vezes, os lugares são, sobretudo, vibração. E mais cedo ou mais tarde, este bairro simbólico e fascinante de Luanda, tal qual o conhecemos, poderá desaparecer, uma vez terminados os projectos de requalificação.
– O que sente quando escuta estas notícias, Jacques?
– Um murro forte no estômago, náuseas e um profundo desprezo pelos mentores da requalificação, em flagrante desrespeito pelo passado de gerações. Não quero dizer com isso que sou apologista da manutenção dos casebres de madeira e zinco, nada disso. A solução seriam bibliotecas, centros recreativos e culturais, de formação, parques, enfim… Espero que entendam o que quero dizer… Deveriam encontrar formas para a evocação permanente do Bairro Operário, imortalizando nomes de pessoas, de ruas, de casas, de lojas. Essa seria a homenagem merecida!
Bê Ó. Histórias, segredos, lutas, noites de facas longas, quintais de farras e de ideais ao rimo da dikanza. Tardes de Manguxi. Raiz nostálgica de todos nós a ponto de ser arrancada do velho chão de areia.
Como ir:
Para chegar ao Bairro Operário, vá em direcção ao São Paulo, pela Avenida Cónego Manuel das Neves. O BO encontra-se à sua esquerda. Pode também chegar pelo Miramar, subindo a rua Ndunduma, e entrando nos vários acessos à sua direita, ou seguindo em frente pela Alameda Manuel Van-Dúnem, no cruzamento com a Av. Cónego Manuel das Neves.

quarta-feira, 13 de julho de 2022

Lisboa - Luanda as imagens e algumas curiosidades


Sá e Silva, Madruga, Salvado e Braz Gonçalves
Pouco importa a ordem cronológica das fotos.
Todas são da viagem no Vera Cruz entre o Cais da Rocha em Lisboa  e o porto de Luanda.
São os 53 anos entre aqueles dias e os de hoje, A bordo foram cimentadas muitas amizades que perduram até aos nossos dias. Muitas deixaram as saudades imensas dos que entretanto já faleceram e por cá deixaram a família, as esposas, filhos e netos.
A bordo, os nossos pensamentos reportavam os medos do futuro que a guerra escondia naquelas terras tão distantes das nossas e 
esse escondia-se na intimidade de cada um. Na verdade a preparação para a guerra e o treino que nos haviam dado davam algum suporte  psicológico que cedo ou tarde  dariam alguma ajuda.
Partida de Lisboa
A bordo daquele enorme navio a vida decorria com normalidade e com a curiosidade do monstro de aço estar sempre a navegar adornado para bombordo, o que nos corredores não deixava uma imagem engraçada quando por lá passávamos.
Ementa

A passagem pelo Funchal para embarcar uma companhia de caçadores formada naquela ilha, não muitas horas depois da saída de Lisboa, serviu para mais uns momentos de descontração e levar ao esquecimento as preocupações no futuro.
 O Vera Cruz, não era propriamente um navio de cruzeiro pois naquela data nem disso por cá haveria conhecimento
Foto na Ilha da Madeira
O dia a bordo em nada se parecia  entre oficiais e sargentos. As praças iam em locais como se fossem casernas, muito mal instalados e em más condições.
Pela viagem, foram feitas alguns exercícios de salvamento e até contadas algumas histórias, que por desconhecidas ou até acreditadas por outros não deixaram de ter a sua piada. Alguns acreditaram que a passagem do barco para imaginária linha do equador fazia com que se estragassem muitos dos mantimentos que as famílias dos militares levavam nas suas bagagens,  Na verdade foi tudo brincadeira. Talvez a meio da viagem demos conta de algo que não sabíamos - peixes voadores que saindo do mar voavam uma boa distância


terça-feira, 12 de julho de 2022

João Marques fez anos


 O vague-mestre da CCS - nunca passamos fome mas a emengta foi muitas, muitas vezes repetida
 Ah,Ah, Ah

12 de Julho de 1969 a 12 de Julho de 2022

Pouco importa o tempo que medeia entre estas duas datas para muitos portugueses



Os almoços


A medalha, o símbolo da Infantaria e a chapa que quando partida a meio significava a morte




Muitos dos actuais governantes nem passaram pela Guerra de África, pelo que nem podem e nem querem imaginar o que foi a ida  para o "incerto", deixando por cá os familiares mais queridos e os amigos, interrompendo uma vida que estava no seu percurso normal.
Hoje, os antigos combatentes, são esquecidos e não vêem reconhecidas pelo Estado que os mandou para a Guerra, as doenças resultantes de sua passagem por esse período da sua vida.
Com dezenas de livros, artigos de jornais, programas de televisão, fotos, blogs e muitos outros meios  de publicitar as passagem da Guerra de África, mais não servem que deixar um testemunho para os seus filhos, netos e todos  os outros vindouros daquilo que foi uma fase negra das suas vidas.

Assim foi naquele dia 12 de Julho de 1969, com o Vera Cruz, repleto de militares a caminho de Angola.
Nós fomos um daqueles que regressaram são e salvo. Outros o fizeram doentes ou estropiados para toda a vida

Muitos outros por lá ficaram,  mortos ou desaparecidos. 

Eu, combatente , me confesso

Poema  camarada  ANTÓNIO FILIPE retirado da Internet


 Eu, Combatente, me confesso:
Se tu soubesses, Marcelo
O "pó" que comi na picada
A dor que trago no peito
Que me ficou entranhada...
Escusavas de ser Presidente
De discursar na Bancada...
Ignorar tão "Boa Gente"
Que comeu "pó" na picada
Se te entrassem na mente
Dores sofridas nos combates
Olharias bem mais de frente
Tais vitimas dos "disparates" !
Cumpridos...lá tanto atrás...
Transfigurados já dos embates
A Ti, pobre... já nem te apráz
Sequer...fazer os seus resgátes !
Que te sobra Marcelo fazer?
Em vez de passear só em vão...
Ir buscar um distante prazer...
Às campas enterradas do sertão
Ressuscitar..."Nobres Mortos"
A cujos calcanhares nem chegas...
Trazer contigo seus "Despojos"
Sem azedumes e sem invejas...
Poderás olhar bem de frente
Quem não te proclamou "Rei"
E ser "Rei" para toda a gente
Sem mácula alguma, eu sei...!
Faltam-te dar certos passos
Para cortares a nossa "Meta"
Deixar danças e compassos
Seres um verdadeiro "atleta"
Que busca "Medalhas de Ouro"
Para a nobre Pátria realçar
Esses sim...são o tal tesouro
Que a todos cabe resguardar...
Não enjeitas a fama honrada Os proveitos são todos "vossos"...
Políticos lá comem pela calada...
E "outros"... são os "Colossos"!
Acabar com a vergonhosa "Trampa"
Que inunda, desmedida, a Nação...
Deixar as fictícias "Luzes da Ribalta"
Aos palhaços...saber dizer Não e Não!
Poisar teus pés.. ainda a tempo. Neste chão!!!
Desejo de, pelo menos... um Combatente!!!

Tentúgal, 11 de Junho de 2018

Livros - Temas da Guerra de Africa - Golden Gate - 7