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segunda-feira, 30 de abril de 2018
sexta-feira, 27 de abril de 2018
Tramagal - Memorial de homenagem aos combatentes do Ultramar
quarta-feira, 25 de abril de 2018
Angola - Lista das Unidades envolvidas na Guerra
terça-feira, 24 de abril de 2018
José Niza andou por aqui
COMO NASCEU UM DISCO
Esta é a capa do LP "Fala do Homem Nascido", etiquete "Orfeu", edição de Arnaldo Trindade & Cª., Lda, Porto. Novembro 1972.
Um belíssimo disco da música portuguesa, um disco de referência.
Poemas de António Gedeão
Músicas de José Niza
Interpretações de Tonicha, Samuel, Carlos Mendes, Duarte Mendes.
Arranjos e Direcção de Orquestra de José Calvário
Gravação de orquestra nos estúdios Celada (Madrid) por Pepe Fernandez, Enrique Rielo e Vinader.
Gravação de vozes nos estúdios Polyson (Lisboa)
Produção de José Niza
Arranjo gráfico de Beatriz Morais Alçada
Fotografias de Álvaro João
José Niza conta:
"Zau Évua (Norte de Angola).
Abril-Maio de 1970.
O correio da guerra trouxe um livro. "Poesias Completas", de António Gedeão. "Para musicar. Um abraço. Cambezes". Quase automático. Gedeão é um dos poetas mais musicais (musicáveis) da língua portuguesa. E a sua poesia, minha velha amiga. Esses poemas, a angústia, o estar aqui, a viola, as noites, os estilhaços de um povo, o torniquete equatorial, a medicina artesanal, o resto, tudo tornaram fácil. Tão fácil, como sentir o arame farpado rasgando a pele dos sentidos. Tudo tomou, também, um repentino sentido. Não eram poemas isolados, mas uma história, o que estava ali escrito. E a história, e a poesia, eram demasiado belas para que a música as estragasse. Havia o Homem. Havia uma história. Havia um palco: a Vida. Eu daria apenas um pouco de música e um pouco de ordem. Mas, o importante, era o Homem. Mesmo à dimensão de uma rodela negra, num rodopio de 33 voltas por minuto.
Do início ("numa qualquer manhã, um qualquer ser, / vindo de qualquer pai, / acorda e vai, / como se cumprisse um dever") até "vestidos de surrobeco / e acocorados no chão", vai um salto de 20 séculos. Um drama em tempo de LP. Um disco pensado alto. Este o esquema, o funil, o encurralar da ovelha. Sob uma macieira de plástico, o homem nascido-em-qualquer-parte diz donde vem e o que quer:
"Venho da terra assombrada
do ventre da minha mãe;
não pretendo roubar nada
nem fazer mal a ninguém".
Mas avisa:
"Não há poder que me vença
mesmo morto hei-de passar".
Assim começa a fala do homem nascido. O pior é que o mundo não é o que devia ser. Há o desencanto do desencontro. O diálogo não passa de monólogo. As palavras são, apenas, sons. Para isto, mais vale "morrer atolado / na mais negra solidão". (A esta indiferença, a esta fácil aceitação da fatalidade, chamava Roger Vaillant, em "La Loi", "se portugalizer"). No entanto, nem tudo está, ainda, perdido. Acredita-se, mesmo por detrás da angústia, das contradições e de um quotidiano feito de misérias e esperanças, que "todo o tempo é de poesia". Há uma dinâmica permanente entre "bombas que deflagram / corolas que se desdobram / corpos que em sangue soçobram / vidas que a amar se consagram". O Homem acaba por ganhar o desafio, palmo a palmo, dia a dia, calo a calo: "Tenho sofrido poesia... / dói esta corda vibrante / a corda que o barco prende... / se vem onda que a levante / vem logo outra que a distende / não tem descanso jamais". Uma vitória adiada. Um volte-face do disco, um percurso do geral para o particular. Entramos em Portugal.
Todo um (saudável) culto do passado, construído sobre um saudosismo que ainda dói – "Poema da Malta das Naus" – é, a um tempo, homenagem, crítica e incitamento ao Homem Português de ontem e de hoje. O marinheiro quinhentista "moldou as chaves do mundo", mas toda essa epopeia teve (e tem) o seu preço, o preço trágico de uma "lágrima de preta". Este o drama dos descendentes da malta das naus: a ciência diz-lhes que a lágrima não tem "nem sinais de negro / nem vestígios de ódio". Mas... e daí? De que vale a ciência da análise, se o Homem Nascido não está preparado para a aceitar? Bastará a ciência ao Homem para que ele se humanize? Filipe II (que aqui se cognomina de Manuel I) tinha tudo, tudo! "Mas o que ele não tinha / era um fecho éclair". É isto que dói ao Homem Nascido: o não ter coisas tão aparentemente simples e possíveis como um fecho éclair. Jamais a felicidade completa. Sobretudo por ser conseguida à custa da felicidade dos outros. "Lágrima de Preta" é o primeiro poema que, no disco, se dirige à mulher.
A Mulher Portuguesa, mulher em vias de desenvolvimento, é hoje, talvez, o exemplo recente de uma nova forma de alienação. Ao fazer-se uma (demagógica) promoção da mulher, inaugura-se um moderno processo de a escravizar: a escravidão pelo trabalho desumanizado. E escravidão não só à dimensão da sociedade, mas na intimidade da sua própria vida (trabalho, casa, filhos, marido, trabalho... um ciclo vicioso infernal que uma vez iniciado não pode parar). "Calçada de Carriche" é um hino à escravidão da mulher-mártir, frágil máquina suburbana que o quotidiano da cidade suga. Mulher, máquina, máquina, que o vertiginoso e breve amor dos domingos evade para as auto-estradas, na doce ilusão de o novo mundo dos sentidos não ter segundas-feiras...
A evasão dá-se. "Leonor, Leonoreta, fuge, fuge, vai na asa de lambreta", com o único rumo de fugir a si própria, numa ilusória felicidade, fugaz como a paisagem que a lambreta rasga.
O cerco aperta-se. O Homem torna-se cada vez mais circunscrito. De um trilião de homens passa-se para o grupo e, finalmente, para o indivíduo, para o homem concreto, com nome, residência e tudo. "Álvaro Góis / Rui Mamede / filhos de António Brandão / naturais de Cantanhede...". Eles vivem, existem, são. Em Braga ou em Olhão, no Alentejo ou na guerra, eles lá estão! "Vivos", "vestidos de surrobeco" e "acocorados no chão", eles estão em toda a parte. No chão, mas ainda vivos... Eis a "Fala do Homem Nascido"!
ELE nasceu numa qualquer manhã e não há poder que o vença. Mesmo morto há-de passar!
Lisboa, Novembro de 1972.
Dois anos e meio passados, o disco fez-se.
No caminho ficaram muitas ideias, entre as quais o entusiasmo de amigos como o Rui Ressureição e o Manolo Diaz, que, comigo em África, quiseram esperar por mim. Como muitas vezes acontece, novas oluções surgiram, entre as quais a que o talento e a inteligência de José Calvário trouxeram a todo este trabalho.
Que António Gedeão me desculpe algumas amputações que fiz aos seus poemas, determinados por razões musicais
Que, dos erros que houver, me ataquem a mim.
P.S. – Para o Eduardo Cambezes;
Para ouvir. Um abraço. Niza."
Confraternização de 2018
E Depois do Adeus - Paulo de Carvalho
Faleceu, aos 75 anos, o músico, em Lisboa, o músico, letrista, médico e ex-deputado socialista José Niza. Entre muitas outras canções foi o autor de E Depois do Adeus, tema interpretado por Paulo de Carvalho. Republicamos acima a 'autobiografia' que escreveu para o JL
segunda-feira, 23 de abril de 2018
BCAC2832 em Tomboco e Zau Évua
Em 26Fev70 o BCaç foi rendido pelo BCaç 2859.
atalhão de Caçadores 2832
Identificação: BCaç 2832
Unidade Mobilizadora: RI 2 - Abrantes
Comandante: Tenente-Coronel de Infantaria Pedro Barcelos
2.º Comandante: Major de Infantaria Élio Pires Afreixo
Oficial de Informações e Operações Adjunto: Major de Infantaria Luís dos Santos Rafael
Comandantes de Companhia:
Companhia de Comando e Serviços (CCS):
Capitão do Serviço Geral do Exército José Mateus Cardoso
Companhia de Caçadores 2306 (CCac2306):
Capitão de Infantaria José Augusto Serra Pinto
Capitão de Infantaria António Augusto Pinto da Cunha Leal
Capitão de Infantaria José Augusto Serra Pínto
Companhia de Caçadores 2307 (CCac2307):
Capitão de Infantaria António Augusto Pinto da Cunha Leal
Capitão de Infantaria Manuel Estevão Martinho da Silva Rolão
Capitão de Infantaria António Augusto Pinto da Cunha Leal
Companhia de Caçadores 2308 (CCac2308):
Capitão Mil.º de Artilharia Fernando Manuel de Lemos Campeão Silveira
domingo, 22 de abril de 2018
sexta-feira, 20 de abril de 2018
José Niza andou por aqui
COMO NASCEU UM DISCO
Esta é a capa do LP "Fala do Homem Nascido", etiquete "Orfeu", edição de Arnaldo Trindade & Cª., Lda, Porto. Novembro 1972.
Um belíssimo disco da música portuguesa, um disco de referência.
Poemas de António Gedeão
Músicas de José Niza
Interpretações de Tonicha, Samuel, Carlos Mendes, Duarte Mendes.
Arranjos e Direcção de Orquestra de José Calvário
Gravação de orquestra nos estúdios Celada (Madrid) por Pepe Fernandez, Enrique Rielo e Vinader.
Gravação de vozes nos estúdios Polyson (Lisboa)
Produção de José Niza
Arranjo gráfico de Beatriz Morais Alçada
Fotografias de Álvaro João
José Niza conta:
"Zau Évua (Norte de Angola).
Abril-Maio de 1970.
O correio da guerra trouxe um livro. "Poesias Completas", de António Gedeão. "Para musicar. Um abraço. Cambezes". Quase automático. Gedeão é um dos poetas mais musicais (musicáveis) da língua portuguesa. E a sua poesia, minha velha amiga. Esses poemas, a angústia, o estar aqui, a viola, as noites, os estilhaços de um povo, o torniquete equatorial, a medicina artesanal, o resto, tudo tornaram fácil. Tão fácil, como sentir o arame farpado rasgando a pele dos sentidos. Tudo tomou, também, um repentino sentido. Não eram poemas isolados, mas uma história, o que estava ali escrito. E a história, e a poesia, eram demasiado belas para que a música as estragasse. Havia o Homem. Havia uma história. Havia um palco: a Vida. Eu daria apenas um pouco de música e um pouco de ordem. Mas, o importante, era o Homem. Mesmo à dimensão de uma rodela negra, num rodopio de 33 voltas por minuto.
Do início ("numa qualquer manhã, um qualquer ser, / vindo de qualquer pai, / acorda e vai, / como se cumprisse um dever") até "vestidos de surrobeco / e acocorados no chão", vai um salto de 20 séculos. Um drama em tempo de LP. Um disco pensado alto. Este o esquema, o funil, o encurralar da ovelha. Sob uma macieira de plástico, o homem nascido-em-qualquer-parte diz donde vem e o que quer:
"Venho da terra assombrada
do ventre da minha mãe;
não pretendo roubar nada
nem fazer mal a ninguém".
Mas avisa:
"Não há poder que me vença
mesmo morto hei-de passar".
Assim começa a fala do homem nascido. O pior é que o mundo não é o que devia ser. Há o desencanto do desencontro. O diálogo não passa de monólogo. As palavras são, apenas, sons. Para isto, mais vale "morrer atolado / na mais negra solidão". (A esta indiferença, a esta fácil aceitação da fatalidade, chamava Roger Vaillant, em "La Loi", "se portugalizer"). No entanto, nem tudo está, ainda, perdido. Acredita-se, mesmo por detrás da angústia, das contradições e de um quotidiano feito de misérias e esperanças, que "todo o tempo é de poesia". Há uma dinâmica permanente entre "bombas que deflagram / corolas que se desdobram / corpos que em sangue soçobram / vidas que a amar se consagram". O Homem acaba por ganhar o desafio, palmo a palmo, dia a dia, calo a calo: "Tenho sofrido poesia... / dói esta corda vibrante / a corda que o barco prende... / se vem onda que a levante / vem logo outra que a distende / não tem descanso jamais". Uma vitória adiada. Um volte-face do disco, um percurso do geral para o particular. Entramos em Portugal.
Todo um (saudável) culto do passado, construído sobre um saudosismo que ainda dói – "Poema da Malta das Naus" – é, a um tempo, homenagem, crítica e incitamento ao Homem Português de ontem e de hoje. O marinheiro quinhentista "moldou as chaves do mundo", mas toda essa epopeia teve (e tem) o seu preço, o preço trágico de uma "lágrima de preta". Este o drama dos descendentes da malta das naus: a ciência diz-lhes que a lágrima não tem "nem sinais de negro / nem vestígios de ódio". Mas... e daí? De que vale a ciência da análise, se o Homem Nascido não está preparado para a aceitar? Bastará a ciência ao Homem para que ele se humanize? Filipe II (que aqui se cognomina de Manuel I) tinha tudo, tudo! "Mas o que ele não tinha / era um fecho éclair". É isto que dói ao Homem Nascido: o não ter coisas tão aparentemente simples e possíveis como um fecho éclair. Jamais a felicidade completa. Sobretudo por ser conseguida à custa da felicidade dos outros. "Lágrima de Preta" é o primeiro poema que, no disco, se dirige à mulher.
A Mulher Portuguesa, mulher em vias de desenvolvimento, é hoje, talvez, o exemplo recente de uma nova forma de alienação. Ao fazer-se uma (demagógica) promoção da mulher, inaugura-se um moderno processo de a escravizar: a escravidão pelo trabalho desumanizado. E escravidão não só à dimensão da sociedade, mas na intimidade da sua própria vida (trabalho, casa, filhos, marido, trabalho... um ciclo vicioso infernal que uma vez iniciado não pode parar). "Calçada de Carriche" é um hino à escravidão da mulher-mártir, frágil máquina suburbana que o quotidiano da cidade suga. Mulher, máquina, máquina, que o vertiginoso e breve amor dos domingos evade para as auto-estradas, na doce ilusão de o novo mundo dos sentidos não ter segundas-feiras...
A evasão dá-se. "Leonor, Leonoreta, fuge, fuge, vai na asa de lambreta", com o único rumo de fugir a si própria, numa ilusória felicidade, fugaz como a paisagem que a lambreta rasga.
O cerco aperta-se. O Homem torna-se cada vez mais circunscrito. De um trilião de homens passa-se para o grupo e, finalmente, para o indivíduo, para o homem concreto, com nome, residência e tudo. "Álvaro Góis / Rui Mamede / filhos de António Brandão / naturais de Cantanhede...". Eles vivem, existem, são. Em Braga ou em Olhão, no Alentejo ou na guerra, eles lá estão! "Vivos", "vestidos de surrobeco" e "acocorados no chão", eles estão em toda a parte. No chão, mas ainda vivos... Eis a "Fala do Homem Nascido"!
ELE nasceu numa qualquer manhã e não há poder que o vença. Mesmo morto há-de passar!
Lisboa, Novembro de 1972.
Dois anos e meio passados, o disco fez-se.
No caminho ficaram muitas ideias, entre as quais o entusiasmo de amigos como o Rui Ressureição e o Manolo Diaz, que, comigo em África, quiseram esperar por mim. Como muitas vezes acontece, novas oluções surgiram, entre as quais a que o talento e a inteligência de José Calvário trouxeram a todo este trabalho.
Que António Gedeão me desculpe algumas amputações que fiz aos seus poemas, determinados por razões musicais
Que, dos erros que houver, me ataquem a mim.
P.S. – Para o Eduardo Cambezes;
Para ouvir. Um abraço. Niza."