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terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Jose Niza escreve

Pandemia do fato azul
Como a gripe, tudo isto começou com um caso isolado, aos domingos à noite, na Sic Notícias. Ou, mais concretamente, num monólogo de mais de uma hora sobre a fenomenologia do futebol, “a verdade desportiva”, o “bas-fond” das arbitragens, as histórias escabrosas dos vários apitos, os amores e desamores do senhor Pinto da Costa com a menina Carolina, sei lá que mais. O protagonista do “Tempo-Extra”- assim se intitula o dito programa – chama-se Rui Santos. Mas também já ouvi tratá-lo por “palhacinho”.
Fixei-me neste programa, não porque aprecie as palestras do prolífero jornalista, mas por causa do seu espampanante casaco azul às riscas brancas. Aquele esplendoroso terno assertoado tornou-se para mim numa obcessão, numa fixação azuliforme, numa dependência visual cromática. E, também, num suspense hitchcockiano de domingo em domingo, por causa da angustiante possibilidade de o palestrante poder surgir perante as câmaras com um vulgar e reles fato cinzento. Deixando – por isso – de ser ele próprio.
Durante um prolongado tempo, as virusais moléculas azuis dos casacos às riscas não contaminaram viv’alma. Mas, de repente, eis que tudo mudou.
E foi tudo tão rápido que nem sequer houve ensejo de fabricar vacinas.
Hoje, um cidadão liga para o telejornal da RTP e José Rodrigues dos Santos – o nosso próximo Nobel da literatura – lá está piscando o olho e perorando desgraças dentro do seu fato azul às riscas. Mas, se mudarmos para a Sic, surge-nos Rodrigo Guedes de Carvalho – o nosso próximo Nobel da escrita – engalanado com o seu azulado fato às riscas brancas a desvendar os escândalos do dia. Se fizermos “zapping” para a TVI, lá temos o escritor Júlio Magalhães – provavelmente o nosso segundo Nobel literário – envergando briosamente o seu fato azul às riscas, a perorar contra o Sócrates sob a protecção divina da liberdade de imprensa. O último reduto – julgava eu – seria o refúgio na RTP2. Mas, qual quê? Mal carreguei no comando – e explodindo no pequeno ecrã – surgiu, reluzente, João Adelino Faria, o único que ainda não ameaçou escrever qualquer livro e que tem um terno de listas brancas largas que até parecem pranchas de wind-surf a sulcar o mar azul da praia do Meco. Esperançado em melhores dias, voltei à Sic Notícias. Mas aconteceu o que eu receava: um Mário Crespo fardado de azul às riscas, ali no seu posto, e, para variar, dizendo cobras e lagartos do governo.
Milagrosamente – saiba-se lá porquê – esta pandemia ainda não chegou, nem aos ministros, nem aos deputados. E, se chegou a Belém – ou não chegou – é coisa que só saberemos através de escutas.
Uma preocupante notícia de última hora refere que a Organização Mundial de Saúde entrou em alerta máximo por causa da previsível propagação da pandemia a toda a Europa. É que, numa rua de Bruxelas – e vestindo um fato azul às riscas brancas – foi identificado um cidadão baixinho e anafado, de nacionalidade portuguesa, que declarou chamar-se Paulo Rangel.
Bem dizia a minha avó que, contra fatos, não há argumentos…
O Ribatejo

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